SOCIALISMO: Um Projecto de Sociedade

Miguel Judas

As Comunidades Socialistas


O Capitalismo gere mercados. O Socialismo é gerido pelas Comunidades. Numa sociedade Socialista poderão existir diversos tipos de Comunidades: - Comunidades Socio-territoriais, formadas com base num território comum, nos assentamentos de seres humanos aí residentes e em alguns elementos "atractores" (recursos naturais, encontro de vias de comunicação, etc.), e constituídas pelo vasto e diversificado conjunto de relações sociais entre os seus membros, de carácter afectivo, cultural ou produtivo, através das quais estes realizam uma parte substancial das suas vidas. Numa perspectiva mais vasta e integrada, as comunidades socio-territoriais englobam igualmente todos os seres vivos aí "residentes". As comunidades socio-territoriais de base, que constituem nós de terceiro nível da rede social geral, são unidades mais complexas que os nós de nível inferior acima referidos, e são dotadas de estruturas vocacionadas para responder, quantitativa e qualitativamente, a muitas mais necessidades sociais que estes últimos. Comunidades humanas pouco numerosas, a viver sobre si próprias, geram relações de grande dependência mútua entre os seus membros mas ficam bloqueadas a um baixo nível de complexidade funcional (satisfazem somente necessidades elementares). Daí a tendência para a aglomeração populacional e a criação de comunidades mais complexas à medida que novas necessidades sociais são sentidas. Por isso, as comunidades sócio-territoriais de base devem agrupar-se entre si para constituírem associações inter-comunitárias que asseguram algumas funcionalidades que ultrapassam a capacidade das comunidades de base, ou, ainda, comunidades urbanas amplas (cidades), ainda mais complexas e dotadas, que asseguram, de modo integrado, quase todas as funcionalidades necessárias para a reprodução e o desenvolvimento social. As funcionalidades que, em termos quantitativos ou qualitativos, não possam ser assegurados pelas comunidades socio-territoriais de base ou urbanas em conformidade com as necessidades sociais, imediatas ou de longo prazo, deverão ser asseguradas através de estruturas federativas inter-comunitárias altamente dotadas, conformando órgãos de administração socio-territorial de âmbito regional, estadual ou nacional, os quais serão permanentemente responsáveis perante as comunidades socio-territoriais ou urbanas que os conformaram, de acordo com os princípios da democracia integral. - Comunidades socio-produtivas, constituídas com base nos colectivos de trabalho social em todas as unidades produtivas de bens e serviços para as comunidades e para a sociedade no seu conjunto. Em cada unidade de produção social dotada de autonomia administrativa, a respectiva "Cooperativa de Participação Social" (CPS) constitui uma comunidade socio-produtiva de 1º nível, com as competências correspondentes. Estas comunidades socio-produtivas de 1º nível deverão associar-se geograficamente de modo a constituírem Congressos Produtivos Comunitários, Inter-comunitários e Gerais, participando nas correspondentes estruturas do Poder Popular. No âmbito de cada ramo ou cadeia produtiva as comunidades socio-produtivas deverão federar-se em Federações Produtivas por Ramo ou Cadeia Produtiva, participando nas estruturas de administração dos correspondentes Ramos ou Cadeias Produtivas. - Comunidades e Grupos por Motivos de Interesse, cobrindo todos os domínios de interesse dos cidadãos, desportivos, culturais, técnico-científicos, artísticos, ambientais, de turismo e viagens, gastronómicos, religiosos, de estilos de vida, etc., de composição, âmbito e estrutura variável, de acordo com as livres decisões, individuais e colectivas, dos cidadãos nelas interessados. - Comunidades Juvenis Apoiadas e Comunidades Universitárias e de Investigação, constituindo a estrutura básica do sistema de formação cívica e técnico científica da juventude e de formação permanente dos cidadãos, tratadas no capítulo "Na Dimensão Cultural". - Comunidades Socio-Ambientais, constituídas pelo conjunto de todas as comunidades vivas num dado território geográfico protegido, autónomas, fora do âmbito da administração das Comunidades Socio-Territoriais. Nestes territórios, prevalecem os ciclos naturais e os modos de existência das espécies vegetais e animais e das comunidades indígenas vivendo de acordo com os respectivos modelos produtivos e culturais tradicionais, os quais não devem ser significativamente alterados pela actividade humana moderna. Inserem-se igualmente nesta categoria de comunidades as constituídas por indivíduos de diversas proveniências que tenham decidido levar um estilo de vida "alternativo", em estreita e continuada harmonia com a Natureza ou que desenvolvam junto desta actividades de estudo e investigação, de protecção e de recolha cientificamente fundada e orientada das suas dádivas. As comunidades Socio-Ambientais desempenham um papel de extraordinária importância para o conjunto das Sociedades Socialistas, constituindo baluartes de defesa do património Natural e elementos de preservação e aproveitamento social dos conhecimentos ancestrais quanto à relação Homem-Natureza. As Comunidades Socio-Ambientais deverão manter relações funcionais de cooperação com os restantes tipos de Comunidades Socialistas e deverão federar-se nos planos nacional e internacional de modo a constituírem uma rede de acção comum em estreita articulação com as Comunidades Universitárias e de Investigação com afinidades científicas. As Comunidades Socio-Ambientais serão responsáveis pela administração dos respectivos territórios, de acordo com as orientações científicas e procedimentais pertinentes, estabelecidas pelas estruturas de topo de gestão nacional no quadro das orientações de gestão Natural e Ambiental de carácter Global, ao nível planetário. Uma das características fundamentais de todas as comunidades socialistas deverá ser o seu carácter aberto e pluralista, isto é, permitirem não só um permanente fluxo de adesões e desvinculações livres por parte de todos os cidadãos, em conformidade com o seu livre arbítrio, assim como acolherem no seu seio a maior diversidade de pontos de vista e de experiências que promovam o seu desenvolvimento, a criatividade e a inovação. Outra característica fundamental das comunidades socialistas é a sua auto-sustentabilidade e a capacidade de contribuírem de forma equilibrada e responsável para a sustentabilidade de todas as actividades incluídas no âmbito das respectivas associações, federações e na "confederação" geral da sociedade socialista. Este princípio da auto-sustentabilidade não implica qualquer espírito autárcico ou perspectivas "localistas", "regionalistas" ou qualquer outra espécie de "tribalismo" que possa por em causa a unidade geral da sociedade como um organismo integral e complexo. Pelo contrário, será a condição essencial para que a solidariedade inter-comunitária seja aplicada com transparência e constitua um factor de reforço da coesão geral. Haverá muitos casos de comunidades socio-territoriais, socio-produtivas e outras que, pela especificidade das suas condições e objectivos prosseguidos dificilmente serão plenamente auto-sustentáveis. No entanto, a sociedade no seu conjunto poderá considerar a sua validade e importância geral e manter-se disposta a conservá-las e a apoiá-las. As comunidades socialistas regem-se também pelos princípios da integralidade e da subsidiariedade. O princípio da integralidade afirma que cada comunidade assume a responsabilidade sobre todos os assuntos relativos à sua vida própria e a responsabilidade de participar de modo activo, criativo e solidário nos assuntos comuns, inter-comunitários e a toda a sociedade, de carácter social, produtivo, cultural, territorial e ambiental-natural, de defesa e segurança, numa perspectiva integrada e holística. O princípio da subsidiariedade indica que cada comunidade deverá ser responsável directa pela concepção e execução de todas as actividades sociais para as quais se encontre dotada dos necessários conhecimentos e meios de acção num quadro de racionalidade e eficiência social, económica e ambiental, transferindo somente para os escalões de gestão social inter-comunitários e societal geral as funções e actividades que poderão ser melhor resolvidas em cooperação nesses âmbitos. A título exemplificativo poderá referir-se que deverão constituir responsabilidade directa comunitária todas as questões relativas à economia urbana e do habitat no âmbito do respectivo território, e responsabilidade de toda a sociedade as questões relativas às redes gerais de infraestruturas de comunicações e transportes e à protecção estratégica das condições ambientais-naturais. A aplicação destes princípios confere uma grande adaptabilidade e a optimização das soluções às circunstâncias e à dinâmica das necessidades sociais, libertando os normativos sociais do carácter impositivo e standardizador próprio do aparato jurídico-legal burguês. A ciência, a moral socialista e a eficiência social, económica e ambiental, constituirão os únicos fundamentos do sistema jurídico socialista. Numa sociedade socialista, todas as comunidades se articularão em redes, livres e de geometria variável, não só no sentido da satisfação das necessidades sociais já reconhecidas como de se estimularem mutuamente na antecipação do futuro.

A Sociedade Socialista

A sociedade Socialista é um organismo no qual todos os seus constituintes individuais gozam de plena soberania pessoal e se associam livremente no mais diverso tipo de comunidades funcionais articuladas em redes altamente adaptativas, tendo em vista a Felicidade Humana. A sociedade socialista não é um conjunto de seres humanos atomizados e em competição desenfreada pela sobrevivência e reduzidos, na sua imensa maioria, à simples condição de assalariados, de consumidores ou de "excluídos", como no Capitalismo. Ela é, antes, um vasto conjunto de seres humanos integrais que cooperam livremente uns com os outros, em comunidades livres e abertas, numa interacção permanente que potencia as capacidades individuais e colectivas. Ela representa-se como uma grande confederação de comunidades dotada de inteligência racional e emocional que integra todos os processos necessários ao seu próprio desenvolvimento harmonioso no plano interno, com as restantes sociedades humanas e com o ambiente natural. Essas estruturas de administração social de alto nível, que constituem nós de integração geral, ocuparão, no Socialismo, as funções do antigo Estado capitalista que não transitaram para o âmbito directo das comunidades socio-territoriais de base ou urbanas ou para o âmbito das comunidades socio-produtivas. Contrariamente ao verificado no Capitalismo e em todas as sociedades de classes, nas quais essas estruturas se constituem em instrumentos de domínio e opressão social, dotadas de "vida própria", como "instituições" acima e dominando a sociedade, as estruturas de gestão social de alto nível socialistas constituem meras representações mentais da actividade cooperativa e federativa das diversas comunidades, meros nós e momentos de articulação da actividade social comunitária e inter-comunitária. Nesse sentido serão destituídas de qualquer carácter burocrático ou de perenidade, sendo criadas, transformadas e dissolvidas em todo o momento, em função das necessidades sociais e comunitárias. Os traços gerais acima apresentados quanto à (auto)estruturação social no Socialismo não procuram determinar um "modelo" mas, tão somente, iluminar um caminho, uma direcção tendencial, que cada povo, a partir da sua realidade concreta, deverá percorrer de modo autónomo e adequado, em função das suas especificidades e circunstâncias. Em 1871, há 140 anos, na sua conferência dedicada às "Causas da Decadência dos Povos Peninsulares", o socialista português Antero de Quental afirmava: "Oponhamos à monarquia centralizada, uniforme e impotente, a federação republicana de todos os grupos autonómicos, de todas as vontades soberanas, alargando e renovando a vida municipal, dando-lhe um carácter radicalmente democrático, porque só ela é a base e o instrumento natural de todas as reformas práticas, populares, niveladoras." (sublinhado do Autor)

A Sociedade Humana Global

Os mesmos princípios socialistas de organização e gestão social aplicados no âmbito de cada sociedade "nacional" deverão conformar as estruturas de integração e cooperação mundial, levando à extinção de todas as fronteiras e dos "países". Porém, até se atingir esse ponto de conformação da Sociedade Humana Global, várias fases intermédias terão de ocorrer: A primeira fase comportará três processos simultâneos verificados em três planos distintos: global, "regional" e "nacional": - Democratização das relações internacionais, no quadro da ONU; Com o ascenso das forças democráticas e de orientação socialista à escala global e adequadas políticas de alianças que neutralizem as pretensões hegemónicas dos EUA, será possível restituir à ONU um protagonismo central na administração dos assuntos de interesse global da Humanidade e promover a sua efectiva democratização. Nesse quadro, será possível iniciar a conformação de um Sistema de Desenvolvimento Democrático de Toda a Humanidade que integre algumas componentes chave, designadamente: o desarmamento e a supervisão mundial das componentes militares nucleares e a manutenção da paz em todo o mundo; a regulação democrática das disponibilidades financeiras internacionais e a sua orientação no sentido da erradicação da fome e da pobreza, do asseguramento dos serviços básicos de abastecimento de água e saneamento, de educação e de saúde a toda a população mundial e do desenvolvimento económico harmonioso; a gestão integrada e racional dos recursos energéticos mundiais; o efectivo controlo das condições naturais e ambientais e a regressão dos processos de devastação da natureza em todas as suas componentes; estabelecimento de uma capacidade de resposta integrada e internacional perante a ocorrência de desastres naturais; estabelecimento de um sistema mundial de acesso livre a contínuo ao Conhecimento. - União e integração regional de países Prosseguirão os esforços no sentido da integração económica, social e política em várias regiões, continentes e sub-continentes do mundo, com tanto mais êxito quanto sejam realizadas sobre princípios democráticos, num quadro de cooperação voluntária e mutuamente vantajosa, desenvolvendo complementaridades e a solidariedade mútua, no respeito pelas respectivas culturas e tradições e segundo os ritmos e formas julgadas mais convenientes. - Auto-determinação e direito à independência de todos os povos. Como reflexo da progressiva eliminação das relações de exploração e de domínio de uns homens sobre outros, deverá ser reconhecido o direito de todos os povos à auto-determinação e à independência e à utilização soberana dos respectivos territórios e recursos de desenvolvimento; todas as nações, grandes ou pequenas, "avançadas" ou "atrasadas", terão o direito a constituir os seus próprios "estados" nacionais, dotados de território próprio, recursos e autonomia de decisão, reformulando, se necessário, o mapa político do mundo; sem prejuízo do direito à separação, os actuais Estados multi-étnicos ou multi-nacionais deverão ser preservados e defendidos mediante a adopção de mecanismos de participação política que garantam a defesa dos legítimos interesses de todos os grupos "nacionais" ou étnicos neles integrados; em consequência, serão eliminadas quaisquer formas de dominação política, económica, social ou cultural entre nações. Uma segunda fase será caracterizada por dois processos simultâneos: - A consolidação dos processos de integração política, económica e social democrática e participativa em várias regiões, continentes e sub-continentes; - A adopção de uma "Constituição" Universal consagrando os Valores Fundamentais de Toda a Humanidade e a gradual criação de instâncias de "Governo Global", democrático, representativo e participativo, "em rede", não impositivo e não coercivo, com competências crescentes em matérias de interesse comum de toda a Humanidade. Finalmente, a terceira fase, caracterizada pela reforma de todas as instituições internacionais segundo os princípios da democracia radical e integral, a dissolução de todas as fronteiras e países e a instituição de um sistema de auto-organização comunitária à escala global. Os processos já hoje verificados de "geminação" de cidades entre vários países e de "federação" de grandes zonas metropolitanos por todo o planeta constituem o embrião muito rudimentar do que será o modelo social global do futuro socialista, no qual a associação livre e planetária das comunidades humanas substituirá o velho mundo das fronteiras e dos "países".

No decurso do processo de socialização da economia e da sociedade à escala global, quando a Democracia Radical se encontre solidamente implantada e o essencial dos meios de produção se encontrem socializados, qual o papel, se algum terá, dos partidos políticos que actualmente conhecemos representando, nos seus objectivos, formas organizacionais e métodos de acção política, os profundos interesses antagónicos presentes nas sociedades capitalistas actuais? Provavelmente nenhum. Em contrapartida, florescerão novas formas organizacionais "em rede", profundamente democráticas e participativas (utilizando todas as potencialidades das novas tecnologias de informação e comunicação), de geometria variável, que confrontarão estratégias e alternativas diversas de desenvolvimento da sociedade humana, discutirão prioridades e a melhor afectação dos recursos disponíveis em função dos problemas presentes em cada momento. Toda a população terá acesso irrestrito ao conhecimento e será estimulada a partilhar toda a informação crítica/qualificada que lhe permita participar, de modo consciente e fundamentado, nos processos de decisão colectiva.

 

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